Base de dados : | LILACS |
Pesquisa : | cocaina [Descritor de assunto] and internet [Palavras] |
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Autor: | Vasconcelos, Silvania Maria Mendes; Macedo, Danielle Silveira; Lima, Iri Sandro Pampolha; Sousa, Francisca Clea Florencio; Fonteles, Marta Maria Franca; Viana, Glauce Socorro Barros. |
Título: | Cocaetileno um metabolito da associaçäo cocaina e etanol / Cocaethylene a metabolite of cocaine and ethanol association |
Fonte: | Rev. psiquiatr. clin. (Sao Paulo);28(4):207-210, 2001. ilus. |
Idioma: | Pt. |
Resumo: | A cocaina, droga psicoestimulante, e usada frequentemente em associacao com outras drogas de abuso (alcool, heroina, sedativos, maconha, entre outras). Entre estas, o consumo simultaneo de cocaina e alcool tem aumentado significativamente nos ultimos anos em todo o mundo. Com o objetivo de estudar a associacao entre essas drogas, foi realizada uma pesquisa bibliografica via Internet, utilizando programas de pesquisa cientifica (Pubmed e Lilacs), alem...(AU)
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Descritores: | Cocaína/metabolismo Etanol/metabolismo Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias/complicações
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| -Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias/metabolismo
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Limites: | Humanos |
texto completo:
Cocaetileno: um metabólito da associação cocaína e etanol
Silvânia Maria Mendes Vasconcelos1
Danielle silveira Macedo1
Iri Sandro Pampolha Lima2
Francisca Cléa Florêncio Sousa3
Marta Maria França Fonteles3
Glauce Socorro Barros Viana3
Recebido: 2/2/2001/Aceito: 2/5/2001
RESUMO
A cocaína, droga psicoestimulante, é usada freqüentemente em associação com outras drogas de abuso (álcool, heroína, sedativos, maconha, entre outras). Entre estas, o consumo simultâneo de cocaína e álcool tem aumentado significativamente nos últimos anos em todo o mundo. Com o objetivo de estudar a associação entre essas drogas, foi realizada uma pesquisa bibliográfica via Internet, utilizando programas de pesquisa científica (Pubmed e Lilacs), além de pesquisa em trabalhos relacionados ao assunto. A administração simultânea de cocaína e álcool apresenta alta toxicidade para o homem devido à formação de cocaetileno, um metabólito ativo da cocaína, formado na presença do etanol. O usuário de drogas utiliza essas associações para aumentar o quadro eufórico e diminuir o quadro psicomotor causado pelo álcool. Entretanto, o cocaetileno parece potencializar os efeitos da cocaína, principalmente nos sistemas cardiovascular e nervoso central (SNC). O mecanismo de ação do cocaetileno não está totalmente definido, mas parece agir sinergisticamente com a cocaína no bloqueio da recaptação de monoaminas, como dopamina, noradrenalina e, em menor extensão, serotonina. Assim, podemos concluir que essa associação produz uma taxa de maior letalidade, quando comparado ao uso isolado dessas drogas.
Unitermos: Cocaína; Etanol; Cocaetileno.
ABSTRACT
Cocaethylene a metabolite of cocaine and ethanol association
Cocaine is a psychostimulant frequently used in association with other drugs of abuse (alcohol, heroin, sedatives, marijuana et al.). Among these associations, the administration of cocaine with alcohol has increased significantly in the last years in all the world. The objective of this work was to study the association cocaine-alcohol using a bibliographic research done by Internet (sites: Pubmed and Lilacs), and the papers related to these subjects. The administration of alcohol and cocaine presents high toxicity to men, due to the formation of cocaethylene, an active metabolite of cocaine produced in the presence of alcohol. Subjects use these drugs associated to increase euphoric effects and reduce psychomotor changes caused by alcohol administration. Cocaethylene was seen to potentiate the effects of cocaine mainly in the cardiovascular and central nervous systems. Cocaethylene mechanism of action is not clearly understood, but it seems that this comound makes a synergism with cocaine in its action to block the reuptake of monoamines such as dopamine, noradrenalin and in less extention serotonin. Therefore, we can conclude that this association produces a high lethality when compared to the use of only one of these drugs.
Keywords: Cocaine; Ethanol; Cocaethylene.
Introdução
Drogas de abuso
As drogas de abuso são causadoras de muitos problemas comuns para várias sociedades de todo o mundo. Antigos textos religiosos mostram que, em todas as épocas e lugares, os seres humanos deliberadamente usaram substâncias capazes de modificar o funcionamento do sistema nervoso, induzindo sensações corporais e estados psicológicos alterados. Essas drogas têm grande poder destrutivo não apenas para o indivíduo, mas também para sua família e a sociedade (O’Brien et al., 1995).
As pesquisas mostram que, nos Estados Unidos, houve um aumento entre 2,4% a 6,1% na ingestão associada de drogas de abuso, entre elas, a cocaína e o álcool. Grant e Hartford (1990) estimaram que, na população em geral, cerca de 4 milhões de pessoas usaram cocaína e álcool em algum tempo de sua vida. O álcool em combinação com a cocaína é a associação mais freqüente de uso de substâncias de abuso, que se apresentam comumente para receber atendimentos nas emergências dos hospitais das grandes cidades. Em estudos forenses, cocaína e etanol são freqüentemente identificados em ensaios biológicos de vítimas de acidente de trânsito (Marzuk et al.; 1995).
Com o propósito de estudar a associação entre essas drogas, foi feita extensa revisão bibliográfica pela Internet de textos relacionados ao tema. Os programas de busca utilizados foram Pubmed e Lilacs (palavras-chave: "cocaine and ethanol"), bem como textos envolvendo dados de epidemiologia, farmacocinética, farmacodinâmica, toxicidade e pesquisas laboratoriais da associação de cocaína e álcool.
Formação do cocaetileno
Metabolismo normal da cocaína
A cocaína é metabolizada por três vias: hidrólise pela colinesterase plasmática e, em menor extensão, pela colinesterase hepática, levando à formação de um metabólito inativo, o éster de metilecgonina, cuja excreção ocorre em torno de 32% a 49% na urina (Inaba et al., 1978); benzoilecgonina, formada por hidrólise espontânea (não-enzimática) ou pela ação da enzima carboxiesterase hepática ou plasmática, esse metabólito é o mais ativo da cocaína e é excretado na urina em torno de 29% a 45% (Fish e Wilson, 1969); e norcocaína, metabólito ativo da cocaína formado por um processo de N-desmetilação, responsável por menos de 5% dos metabólitos totais da cocaína (Inaba et al., 1978).
Metabolismo da cocaína na presença do etanol
A combinação do uso de cocaína e álcool aumenta os níveis plasmáticos de cocaína e norcocaína, reduz as concentrações de benzoilecgonina e induz a síntese de cocaetileno (Hedaya & Pan, 1996; Pan & Hedaya, 1999). O cocaetileno é o único metabólito da cocaína formado na presença do etanol (Sobel & Riley, 1999). A transformação metabólica de cocaína para benzoilecgonina é mediada em parte por uma carboxiltransferase hepática (Figura 1), que, na presença do etanol, converte cocaína em cocaetileno (Bosron et al., 1997). Cocaetileno tem alta taxa de distribuição no cérebro/sangue, seguido por cocaína, norcocaína e benzoilecgonina (Pan & Hedaya, 1999). Sua meia-vida plasmática é 3 a 5 vezes maior que a da cocaína, que é em média de 50 minutos (O’Brien et al., 1995). Cocaetileno pode ser estocado nos tecidos do corpo (Hearn et al., 1991) e sua lenta remoção faz dele um atrativo para o abuso (Andrews, 1997).
Aspectos farmacocinéticos da associação cocaína e álcool
A ordem de ingestão de cocaína e álcool é um fator importante e pode influenciar o efeito resultante dessa interação. Quando o álcool é ingerido antes da inalação da cocaína, existe um significativo aumento nas concentrações de cocaína plasmática e nos efeitos subjetivos da cocaína, além de aumento na freqüência cardíaca. Entretanto, quando a cocaína é ingerida antes do álcool, não aparecem alterações nos níveis de álcool sangüíneos ou nas taxas subjetivas de intoxicação pela cocaína, resultando na formação mais lenta e de menores quantidades de cocaetileno (Perez-Reyes, 1994). Além disso, o aparecimento de cocaetileno no plasma não altera o declínio dos efeitos subjetivos e da freqüência cardíaca resultantes da cocaína, nem aumenta as concentrações plasmáticas de cocaína.
Pan & Hedaya (1999), avaliando o efeito da co-administração de álcool e cocaína e o perfil dos metabólitos da cocaína no sistema nervoso central e na atividade cardiovascular de ratos, mostraram que o metabólito benzoilecgonina não teve nenhum efeito no SNC ou na atividade cardiovascular após administração intravenosa de etanol. Cocaína, norcocaína e cocaetileno apresentaram potentes e prolongados efeitos na freqüência cardíaca e nas respostas do intervalo QRS, bem como em efeitos neuroquímicos, e também foram equipotentes no aumento da pressão arterial média. Assim, foi demonstrado que mudanças no perfil dos metabólitos da cocaína e na formação do cocaetileno foram, pelo menos em parte, responsáveis por efeitos mais intensos e duradouros relatados após o uso da combinação cocaína e etanol.
Efeitos da associação cocaína e álcool
Em humanos
A interação entre álcool e cocaína tem sido investigada em humanos. Essas drogas combinadas produzem um aumento mais significativo na freqüência cardíaca e na pressão arterial, quando comparado ao uso isolado de uma das substâncias (Cami et al., 1998), reduzem a sensação de embriaguez (Higgins et al., 1993), aumentam a euforia induzida por cocaína (Perez-Reyes & Jeffcoat, 1992; McCance-Katz et al., 1998) e embotam alguns dos efeitos deletérios do álcool nas tarefas de desempenho psicomotor (Higgins et al., 1993; Farre et al., 1993).
Em testes laboratoriais, indivíduos referem maior sensação de bem-estar depois do uso da cocaína e álcool associados, em comparação ao uso destes isoladamente (Farre et al., 1993). A interação de álcool e cocaína pode resultar não somente em aumento e prolongamento da euforia, mas também em grande toxicidade. Esta toxicidade, em parte, pode resultar em grave comprometimento vital (Hearn et al., 1991), além de contribuir para muitas fatalidades relacionadas à cocaína, mesmo quando esta é encontrada em baixas concentrações sangüíneas (Wetli & Wright, 1979).
Cocaetileno também está relacionado a convulsões, danos hepáticos e diminuição da função do sistema imunológico. Álcool em combinação com a cocaína atenua a percepção subjetiva da sedação (Higgins, 1992). Esses efeitos subjetivos podem levar ao aumento do uso combinado dessas drogas e resultar em uma superestimulação do álcool, aumentando, conseqüentemente, os efeitos deletéricos dessa droga.
Quanto ao mecanismo de ação, parece que o cocaetileno também bloqueia a recaptação de dopamina na fenda sináptica, assim favorecendo a inibição da recaptação de dopamina produzida por cocaína (Tella & Goldberg, 1998). Essa aumento prolongado de dopamina na fenda sináptica pode ser a base da alta labilidade da combinação álcool e cocaína mediante efeito de adição do cocaetileno.
Em animais
Horowitz et al. (1997), estudando o efeito do cocaetileno na atividade locomotora e na estereotipia em ratos Long-Evans e Sprague-Dawley, observaram que o cocaetileno produziu alterações comportamentais somente em ratos da raça Sprague-Dawley. Entretanto, na presença de fluoxetina, inibidor de recaptação de serotonina, os ratos Long-Evans também apresentaram um aumento na atividade locomotora. Baseados nesses resultados, os autores concluíram que o cocaetileno parece ter um efeito menor na recaptação de serotonina, quando comparado à dopamina, e que a base neuroquímica para explicar essa diferença comportamental de efeito do cocaetileno, nessas duas raças de animal, parece estar relacionada à biodisponibilidade da serotonina.
Hayase et al. (1999), estudando a associação de cocaína e álcool em camundongos, observaram que existe maior taxa de mortalidade (86%) nesses animais, em comparação àqueles que usaram cocaína e álcool isoladamente.
Conclusão
A associação de cocaína e álcool produz uma toxicidade maior, em comparação ao uso dessas drogas isoladamente, e essa alta toxicidade ocorre devido à formação do cocaetileno, um metabólito ativo da cocaína formado apenas na presença do álcool. Vale salientar que essa toxicidade, causada pelo cocaetileno, é mais prejudicial para os sistemas cardiovascular e nervoso central, sendo comum aos homens e aos animais.